A música brasileira ganhou o mundo com sua originalidade, diversidade e qualidade. A mistura de povos de origens tão diferentes fez com que, ao longo do século XX, o Brasil se transformasse num fantástico laboratório de ritmos e melodias. Dos sambas de escravos recém-libertos na Bahia à colorida música eletrônica de indígenas no Pará, os mais diversos aspectos da vida nacional foram narrados em grandes canções.

A saborosíssima coleção Movimentos Musicais, escrita pelos jornalistas Júlia Bezerra e Lucas Reginato, publicada no Brasil pela Panda Books, resgata e detalha três incríveis movimentos para homenagear a riqueza e da MPB. Agora, da mesma forma que a música nacional viajou o mundo, os três livros estão disponíveis em português também fora do Brasil, para mais de 100 países, pela Buobooks.

1. O fino da bossa

Nos anos 1960 e 1970, músicos originários da bossa nova carioca agitaram uma nova cena que daria origem ao termo MPB. Em 1965, quando o Brasil parava para acompanhar o primeiro Festival de Música Brasileira, a TV Record botava no ar um programa inovador que iria revolucionar a música, a TV e a história do país como um todo: O Fino da Bossa. Gravado semanalmente em São Paulo, cada episódio apresentava cerca de 20 números musicais de grandes artistas da época. O programa alavancou não apena as carreiras de seus apresentadores, ninguém menos que Elis Regina e Jair Rodrigues, como tornou populares aqueles que são até hoje os maiores artistas da música brasileira: Chico Buarque, Maria Bethânia, Caetano Veloso e Gilberto Gil, entre outros. Mas essa história não foi simples de ser narrada: uma série de incêndios destruiu todos os registros do programa, o que torna a pesquisa e o resgate que Júlia e Lucas apresentam no livro ainda mais importante.

2. Funk

Na década de 1980, a periferia do Rio de Janeiro foi invadida pelo funk norte-americano e acabou recriando o estilo por completo. Em qualquer lugar do mundo, funk é James Brown, George Clinton, Sly Stone. No Brasil é Anitta, Ludmilla, Mr. Catra, Tati Quebra-Barroco, Bonde do Tigrão. Lá fora é elétrico, com arranjos sofisticados e instrumentos orquestrados. Aqui, eletrônico – a melodia crua dos MCs sobre o famoso “batidão”. Como uma coisa se transformou na outra? Como Júlia e Lucas revelam detalhadamente no livro, isso aconteceu de forma gradual, em meio a muito improviso e criatividade, entre a gigantesca Baixada Fluminense e as comunidades que abraçaram os morros da capital.

3. Manguebeat

Os anos 1990 entraram para história da MPB com a junção, no Recife, de rock, hip-hop e maracatu, resultando numa mistura que ficou conhecida como manguebeat – marcada tanto pela inovação musical como por uma inesperada tragédia, a morte precoce do líder Chico Science no auge da carreira. Tudo começou em meio a um período de declínio econômico do estado de Pernambuco, quando o mangue fétido e seus caranguejos, fonte de renda para parte da população, representavam o sentimento dos jovens recifenses. O que saiu dali acabou por influenciar a música de todo o Brasil com seu som extremamente original e letras com forte viés político que tratavam, sem papas na língua, das minorias e dos marginalizados. O terceiro livro-reportagem de Júlia Bezerra e Lucas Reginato vai a fundo no som e nas carreiras de artistas como Chico Science, Fred Zero Quatro, Renato L., Jorge du Peixe e outros.

*Jair Rodrigo, Aracy de Almeida e Elis Regina em foto  do programa O fino da bossa reproduzida no livro. (Folhapress)