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A filosofia da Grécia Antiga aos dias de hoje e da teoria ao cotidiano

“Quem sou?”, “de onde venho?” e “o que estou fazendo?” são perguntas feitas por todos nós em algum momento na vida. A curiosidade é inerente à condição humana e a filosofia é o campo de conhecimento que canaliza toda essa energia em busca de respostas aos principais questionamentos sobre a existência. Na verdade, ela usufrui da razão – uma característica especialmente humana – para conceber o mundo. 

É o espanto e o estranhamento diante do mundo que leva os pensadores gregos Aristóteles, Platão e Sócrates a criar teorias sobre as causas e os princípios (arqué) de toda a realidade, já séculos antes de Cristo. No entanto, a elaboração do pensamento filosófico não é exclusividade dos filósofos, e recebeu contribuições importantes de outras personalidades, como o teólogo São Tomás de Aquino.

Apesar de muitos desses pensadores terem registrado as suas descobertas para a posteridade, a filosofia não se limita ao que está documentado e escrito. Para além das obras, trata-se de um conhecimento vivo, que acontece a partir da troca de argumentos, da discussão de ideias e da reflexão. Ou seja, a filosofia e o conhecimento não têm nada a ver com decorar palavras e discursos. 

Sócrates disse: “só sei que nada sei”. Apesar dessa máxima ter sido evocada há mais de dois milênios, segue extremamente relevante nos dias de hoje. No mundo da pós-verdade, em que as fake news balizam decisões que afetam não apenas o sujeito, mas toda a sociedade, a dúvida é mais que bem vinda e a filosofia pode ser a principal ferramenta para encontrar e construir um futuro coletivo mais esclarecido. 

Filosofar também significa questionar o mundo aparente e os discursos que não condizem com as práticas. Considerando o contexto de hoje, esse hábito ganha mais importância ainda. Não porque estamos dizendo mais mentiras, mas porque elas estão se espalhando mais rápida e frequentemente a partir do desenvolvimento da Internet e da democratização do acesso às novas tecnologias de informação e comunicação. 

Antes do surgimento da filosofia, a inspiração na Grécia Antiga vinha dos poetas, que por sua vez eram inspirados pelas Musas, que, na obra de Homero, concedem três dádivas: o relato, a atração das palavras e a claridade e o encanto da voz. Sócrates observou que a criação poética advinha de um estado de inspiração, e não da sabedoria. Ele propõe, inclusive, uma teoria sobre a inspiração poética que nega uma natureza epistêmica.

A natureza divina que era imputada à poesia, como se o poeta fosse apenas um meio de transmissão, costuma ser associada ao autoconhecimento, como se este fosse igual à espiritualidade. No entanto, vemos desde a Grécia Antiga, com Sócrates, até os tempos mais recentes, com o filósofo francês Michel Foucault, que conhecer-se a si mesmo é um exercício também racional. 

Em Sócrates, o autoconhecimento é intermediado: o sábio ou a sacerdotisa provoca os homens a olharem-se internamente, e isso desenvolve o entendimento e o conhecimento do outro. Em Foucault, trata-se de um hábito adotado pelo sujeito/indivíduo e não necessariamente provocado por alguém. Contudo, em ambos estão presentes as reflexões sobre o cuidado de si e o conhecimento de si, e sobre as relações entre estes.